segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Pantanal!!!

Aos que não conhecem o Pantanal, ninguém melhor que Manoel de Barros pra descrever suas belezas!

Mundo Renovado
(Manoel de Barros)

No Pantanal ninguém pode passar régua. Sobremuito quando chove. A régua é existidura de limite. E o Pantanal não tem limite.
Nos pátios amanhecidos de chuva, sobre excrementos meio derretidos, a surpresa dos cogumelos! Na beira dos ranchos, nos canteiros da horta, no meio das árvores do pomar, seus branquíssimos corpos sem raízes se multiplicam.
O mundo foi renovado, durante a noite, com as chuvas. Sai garoto pelo piquete com olho de descobrir. Choveu tanto que há ruas de água. Sem placas sem nome sem esquinas.
Incrível a alegria do capim. E a bagunça dos periquitos! Há um referver de insetos por baixo da casca úmida das mangueiras.
Alegria é de manhã ter chovido de noite! As chuvas encharcaram tudo. Os baguaris e os caramujos tortos. As chuvas encharcaram os cerrados até os pentelhos. Lagartos espaceiam com olhos de paina. Borboletas desovadas melam. Biguás engolem bagres perplexos. Espinheiros emaranhados guardam por baixo filhotes de pato. Os bulbos das lixeiras estão ensanguentados. E os ventos se vão apodrecer!
Até as pessoas sem eira nem vaca se alegram. E as éguas irrompem no cio os limites do pátio. Um cheiro de ariticum maduro penetra as crianças. Fugiram dos buracos cheios de água os ofídios lisos. E entraram debaixo dos fogões de lenha. Os meninos descobrem de mudança formigas-carregadeiras. Cupins controem seus túneis. E há os bentevis-cartolas nos pirizeiros de asas abertas. 
Um pouco do pasto ficou dentro d'água. Lá longe, em cima da peúva, o ninho do tuiuiú, ensopado. Aquele ninho fotogênico cheio de filhotes com frio! 
A pelagem do gado está limpa. A alma do fazendeiro está limpa. O roceiro está alegre na roça, porque sua planta está salva. Pequenos caracóis pregam saliva nas roseiras. E a primavera imatura das araras sobrevoa nossas cabeças com sua voz rachada de verde.